Nos tribunais norte-americanos, a troca de acusações entre as duas rivais chinesas é semelhante a um jogo de ping pong. Em dezembro de 2023, a Temu instaurou um processo contra a Shein, acusando a concorrente de recorrer a métodos de “intimidação ao ‘estilo da máfia”. As táticas usadas para levarem os fornecedores a cortarem relações com a empresa são descritas ao pormenor nas alegações.
A batalha legal foi espoletada pela Shein (sediada em Nanjing, na China). Em março, processou a etiqueta fundada em Boston (nos EUA, por um grupo chinês) alegando que patrocinava influencers para desacreditarem a Shein nas redes sociais. Mais tarde nesse mesmo mês, levantou outro um processo contra a Temu por confundir os consumidores, levando-os a acreditar que são a mesma marca.
As hostilidades refletem as características comuns às gigantes do comércio eletrónico. Além das controvérsias, as marcas tornaram-se fenómenos por motivos semelhantes: ambas têm origens na China, destacam-se pelos preços competitivos, apostam no marketing agressivo e são procuradas pela variedade de artigos.
Embora só tenha sido lançada em 2022, nos EUA, a Temu (que se pronuncia ti-mu) teve uma ascensão meteórica, ultrapassando a principal rival, a Shein, mas também alternativas como a Wish ou o Aliexpress. Atualmente, é a aplicação mais popular no nosso País, com a principal adversária a ocupar o segundo lugar.
Se muitos clientes se mantêm fiéis à primeira, outros foram convencidos pelas estratégias do mais recente fenómeno das pechinchas. Afinal, qual delas é a melhor? Para tentar encontrar a resposta fizemos uma comparação entre ambas, relativamente a fatores como a segurança, os custos de envio e qualidade dos artigos — já a decisão depende das características valorizados por cada um.
Qual delas tem artigos mais baratos?
Os preços são semelhantes. Com várias ofertas, os artigos de moda e acessórios da Temu (o único ponto de comparação) têm um preço médio entre 10 e 15 euros. Já as tendências de roupa da Shein têm preços inferiores a 20 euros. A principal diferença está nos descontos que chegam aos 90 por cento, no primeiro caso, enquanto a segunda apenas reduz os preços até 50 por cento.
Além dos valores atrativos, a empresa mais nova também oferece propostas gratuitos aos utilizadores em troca da promoção da aplicação, fazendo com que amigos e familiares se inscrevam. Esta é uma das estratégias responsáveis para catapultar a sua popularidade.
“Estavam sempre a atirar-me à cara oportunidades de ganhar mais cupões, mas parecia sempre que tinha de fazer mais uma coisa”, revelou um consumidor australiano ao jornal “The Guardian”. Contudo, vários clientes relatam que, graças aos prémios de referência, já conseguiram encomendar vários artigos sem a custo zero.
Qual oferece o envio mais rápido e/ou barato?
Atualmente, a Temu fornece o envio padrão gratuito para quase todas as encomendas, com tempo de entrega previsto entre 5 a 16 dias úteis. Após realizar o pagamento e confirmar uma encomenda, também pode ver o tempo previsto para a entrega na página de confirmação.
Já a Shein também apresenta o método padrão, com entregas envios grátis, mas entre os 11 e os 16 dias úteis. Outra opção é levantar os artigos de forma gratuita numa loja de conveniência, com um prazo previsto entre 10 a 15 dias úteis. A taxa de manuseio é adicionada para pedidos acima dos 183€.
A primeira opção é ligeiramente mais rápida, pois opera localmente em muitas regiões dos EUA e do Reino Unido. No segundo caso, todo o procedimento acontece a partir da China, onde a empresa está sediada.
Variedade, qualidade e fornecedores
Apesar das comparações, a oferta é muito diferente. Enquanto a Temu é uma plataforma de comércio eletrónico, a concorrente é uma loja de moda online. Isto significa que, além do vestuário, pode-se encontrar produtos tão vastos como eletrodomésticos, decoração, produtos de limpeza, artigos para animais ou até acessórios para automóveis.
Neste sentido, a Shein destaca-se não só pelo seu catálogo de moda atualizado com mais regularidade, como pela qualidade — visto que contrata diretamente todos os fornecedores para fazerem as encomendas e trabalha diretamente com eles.
A empresa sediada em Boston funciona apenas como uma ponte. A plataforma gere as listas, o marketing e a logística, enquanto os fabricantes fazem tudo o resto. E não há informações sobre a origem dos produtos. No fundo, compensa ao acolher vendedores independentes para formar uma seleção em mais de 200 categorias.
Métodos de pagamento, reembolsos e atendimento ao cliente
Ambos têm múltiplas opções de pagamento, aceitando cartão de crédito, Apple Pay, PayPal e serviços Afterpay, por exemplo. E as duas assumem-se como plataformas seguranças para transações por disporem de medidas de segurança robustas para salvaguardas as informações dos consumidores.
A nível das devoluções, a Temu oferece reembolso no prazo de 90 dias após a compra, caso o cliente não esteja satisfeito. As etiquetas de devolução podem ser facilmente impressas e os artigos podem ser enviados de volta gratuitamente.
A Shein tem uma janela de devolução padrão de 45 dias, mas o transporte é pago pelo cliente, excepto se o retorno da peça se dever a um erro da própria empresa. Por isso, é necessário solicitar primeiro uma autorização de devolução.
É aqui que surge outra das maiores diferenças. Se tiver problemas com uma compra na Temu terá acesso a atendimento personalizado e, consoante o atraso, recebe uma compensação para gastar. Em contrapartida, a outra marca chinesa depende de chatbots e as reclamações apontam precisamente as respostas atrasadas ou automatizadas.
Os problemas de transparência e segurança
Em troca dos bens acessíveis, a Temu lucra através dos dados das pessoas. A aplicação solicita cerca 24 permissões em cada dispositivo, incluindo o acesso às informações da sua rede Wi-Fi, Bluetooth, fotografias e vídeos, informações de contacto e detalhes de pagamento.
No início deste ano, a aplicação já tinha sido suspensa temporariamente das lojas da Apple, quando o conglomerado descobriu que enganava os utilizadores. A falta de transparência estava ligada precisamente à forma como utilizavam estas informações.
Sobre este tópico, a empresa explicou à NiT que “não se envolve na venda de dados pessoais e leva essas acusações muito a sério”. “Até agora, enfrentámos cerca de dez processos judiciais nos EUA, quase todos iniciados por um concorrente específico da China. O mesmo concorrente está também por detrás de uma ação judicial intentada por um alegado vendedor da Amazon.”
Qual é a que tem mais avaliações positivas?
Na Temu, as opiniões dos utilizadores divergem. Alguns consideram os artigos “decentes”, outros apontam a “fraca durabilidade”. O controlo de qualidade inconsistente é o mais apontando, enquanto na Shein, o principal problema é que a maioria das roupas são fabricadas em poliéster (e outros tecidos baratos) — e não resistem a muitas lavagens.
Ainda assim, estão lado a lado a nível de utilizadores. A primeira conta com 17 milhões de utilizadores mensais na aplicação e, desde o seu lançamento, ultrapassou os 100 milhões de descarregamentos em poucos meses. Neste momento, ocupa a primeira posição na categoria “Compras” da Apple Store e na Play Store, com uma classificação de 4,8 estrelas.
No segundo lugar, a rival tem uma avaliação ligeiramente inferior, de 4,7 estrelas. No entanto, além de existir há mais tempo — foi lançada em outubro de 2008, na China —, já registou mais de 210 milhões de downloads em todo o mundo só no ano passado.
Algumas pessoas dizem que são um “mercado de pulgas chinês”. Outras referem-se à nova plataforma como “a Shein da Shein”, implicando que é ainda mais suspeito, apesar da popularidade. Apesar de enfrentarem desafios semelhantes, as gigantes da ultra fast fashion continuam a obter resultados astronómicos. Quando dermos por isso, estaremos a falar da chegada da “Temu da Temu”.
Carregue na galeria para conhecer algumas das pechinchas das duas rivais chinesas —das mais bizarras às banais. Os preços começam nos 47 cêntimos.