Estamos, oficialmente, no mês em que se celebram 50 anos da Revolução dos Cravos, evento que será assinalado ao longo do mês (e do ano), com diferentes iniciativas que se dedicam a honrar a herança de liberdade que a data nos deixou. O dia 25 de Abril de 1974, e os que se lhe seguiram, ficarão para sempre na memória de quem os viveu. Para quem estava longe ou ainda não era nascido, restam as imagens que mantêm vivos os rostos e locais que se tornaram protagonistas do momento, captados por quem sabia que os tempos eram de mudança.
Pelas 8h30 do “dia inicial, inteiro e limpo, onde emergimos da noite e do silêncio”, como descreveu Sophia de Mello Breyner Andresen, Jorge Castro estava nas imediações da Praça do Comércio, em Lisboa, a assistir à movimentação das tropas. Respondeu ao apelo de alguém que lhe telefonou para casa, muito cedo, dizendo que era preciso, urgentemente, mobilizar pessoas para a baixa lisboeta, pois algo de muito importante, a nível político, se estava a passar.
Jorge Castro saiu, acompanhado apenas da sua Voigtländer Vito CD. Foi com ela que fotografou a atividade militar e o povo que invadia as ruas de capital, “onde se reinventava o sorriso e a alegria de viver, por tanto tempo reprimida”, refere. É o testemunho desse olhar vibrante, com a História do País a ser escrita diante da lente, que poderá conhecer na nova exposição patente na Biblioteca Municipal de S. Domingos de Rana, a partir desta sexta-feira, 5 de abril.
“A vida saiu à rua num dia assim” reúne uma seleção de 75 fotografias, a preto e branco, tiradas entre o dia 25 de Abril de 1974 e o 1.º de maio, desse mesmo ano. O título da mostra é homónimo de um poema, escrito pelo próprio Jorge Castro para homenagear o dia da liberdade e também José Afonso e o seu poema cantado “A morte saiu à rua” (onde invoca o pintor Dias Coelho, assassinado às mãos da PIDE).
A exposição, com fotografias que eternizam os movimentos militares e populares que mudaram o rumo do País, é organizada pela Câmara Municipal de Cascais, com o apoio do Espaço e Memória – Associação Cultural de Oeiras. A inauguração está marcada para as 18h30 de dia 5 de abril, e poderá visitá-la até 4 de maio, nos dias úteis das 10 às 13 horas e das 14 às 18 horas. A entrada é gratuita.
Jorge Castro nasceu no Porto, em 1952, mas vive em Carcavelos, “porque o mar faz-lhe falta”. A sua paixão pela arte de juntar palavras conduziu-o à publicação de 17 obras, na sua maioria de poesia. Também a fotografia tem tido um lugar de destaque na sua vida, como amador, desde os anos da juventude, razão pela qual teve a oportunidade de viver o 25 de Abril tão perto e de máquina na mão. Em 2009, recebeu a Medalha de Mérito Cultural da Câmara Municipal de Cascais.
“A vida saiu à rua num dia assim,
Naquela noite de abril que surgiu por fim.
O medo sob a calçada fendido cai,
E uma corrente de vida nos peitos vai.
O vento que fustigava o canavial
E o riso de uma ceifeira de Portugal
E o som da bigorna, agora a vibrar no céu,
Vão dizendo em toda a parte que abril venceu.
Porque ninguém saberia da noite igual,
Assim se cumpriu o assalto ao Paço Real.
E o regime assassino que nos castrou,
Por um cravo e uma espingarda enfim se calou.
Aquela manhã mais clara acordou assim
Em festa de um povo que renasceu por fim.
E em cada recanto agreste do nosso chão
Floriram mais de mil cravos numa canção”.
«A vida saiu à rua num dia assim», Jorge Castro.