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Exposição “Paula Rego: Manifesto” chega a Cascais esta semana para celebrar o 25 de Abril

A Casa das Histórias Paula Rego recria a primeira mostra individual da artista, mas não só. Pode visitá-la até 6 de outubro.
"Mocidade Portuguesa", Paula Rego, 2005.

Depois do sucesso da exposição “Mudam-se as histórias, mudam-se os estilos”, que revelava o processo criativo da artista portuguesa, a Casa das Histórias Paula Rego já anunciou qual será a próxima mostra a ocupar o espaço. “Paula Rego: Manifesto” é uma homenagem à primeira mostra da artista, apresentada em 1965, na Sociedade Nacional de Belas-Artes. Será inaugurada esta quinta-feira, 18 de abril.

A exposição pretende relembrar, na celebração dos 50 anos do 25 de Abril, os temas e acontecimentos marcantes da história de Portugal que Paula Rego explorou nas suas obras. Em Manifesto por uma causa perdida” (1965), “Cães famintos” (1963), “Alegoria Britânica” (1962-63), “Tarde de Verão” (1961) e “Fevereiro 1907 O Regicídio” (1965), podemos observar como Paula Rego usava o seu talento para, através dos traços pintados, afirmar uma atitude de resistência contra a ditadura, que considerava anacrónica e absurda.

“Paula Rego: Manifesto” parte, assim, da recriação da primeiríssima exposição individual de Paula Rego, apresentada há quase 60 anos, numa época marcada pela censura e pelo ambiente repressivo e de perseguição realizado pelo regime.

As pinturas exibidas em 1965 (e agora novamente em 2024), retratavam a sua experiência enquanto artista e mulher, revelando a violência da realidade vivida, incluindo também a Guerra Colonial Portuguesa, que a artista criticava. Para explicar e ressaltar a importância daquela exposição no panorama cultural português da época, “Paula Rego: Manifesto” apresenta também documentos daquele período, relacionados com a organização e a receção da exposição em 1965.

“A técnica plurimaterial que a artista desenvolveu, utilizando materiais heterogéneos como tintas, papéis recortados e colados sobre a tela, e os temas abordados, que sugerem um posicionamento crítico e de desafio em relação à autoridade, manifestam uma atitude de resistência política através da prática criativa. A sua primeira exposição individual criou, por isso, nesse ano sombrio de 1965, um espaço de dissensão, confronto e liberdade”, apontam as curadoras da exposição, Catarina Alfaro e Leonor de Oliveira.

Curiosamente, alguns dos trabalhos que integram a mostra só foram localizados recentemente, depois de anos em paradeiro incerto, fruto de um trabalho de investigação ainda decorrer, refere a instituição. O objetivo é conseguir catalogar todos os trabalhos conhecidos que Paula Rego produziu entre as décadas de 1950 e 1960.

Poderá, então, conhecer, nesta mostra, 18 das 19 pinturas que integravam aquele primeiro certame histórico, criadas entre 1961 e 1965, agora novamente reunidas. Contudo, a recriação da exposição original ocupa apenas uma das oito salas da Casa das Histórias Paula Rego.

A segunda parte da mostra apresenta outras 60 obras da artista, propondo um olhar pela interpretação de Paula Rego sobre temas como o contexto pós-revolucionário, os direitos das mulheres, o prazer sexual feminino, a denúncias sobre a repressão, violência e discriminação contra as mulheres, numa clara amostra da intervenção cívica que sempre fez parte da sua carreira artística. 

Estão também presentes, séries mais recentes, como “Mutilação genital feminina” de 2009. Destacam-se, ainda, os desenhos onde confronta a indiferença dos portugueses, pela grande abstenção que resultou do referendo sobre a despenalização do aborto, em junho de 1998. Com estas obras, Paula Rego foi uma importante voz na discussão política em Portugal e “contribuiu decisivamente para consciencialização da opinião pública sobre a necessidade de uma tomada de posição, que viria acontecer no terceiro referendo realizado em 2007 e que veio finalmente alterar a legislação portuguesa”, recordam as curadoras.

As curadoras referem, ainda, considerar Paula Rego como uma artista contrahistoriadora. “A narrativa sobre a ditadura e o processo de democratização têm sido dominados pela perspetiva e ações masculinas. Em contracorrente, a obra de Paula Rego inscreve na abordagem crítica desses momentos históricos não só a experiência feminina, mas também o papel das mulheres na luta pela democracia e pelos seus direitos. O trabalho criativo e a intervenção cívica da artista recordam-nos ainda que a democracia é um projeto em construção e tem que ser revista e promovida constantemente”, referem Catarina Alfaro e Leonor de Oliveira.

“Cães famintos”, Paula Rego, 1963.

A exposição conta também com algumas obras em empréstimo, provenientes das coleções de instituições nacionais como a Fundação Calouste Gulbenkian e a Fundação de Serralves, além de coleções particulares portuguesas, inglesas e francesas.

A mostra estará patente na Casa das Histórias Paula Rego, situada no número 300 da Avenida da República, em Cascais, até 6 de outubro 2024. Pode visitá-la de terça a domingo, das 10 às 18 horas. O bilhete custa 5€.

Paula Rego morreu a 8 de junho de 2022, com 87 anos. Três anos antes, recebeu a Medalha de Mérito Cultural do Governo de Portugal. A iniciativa é organizada pela Fundação D. Luís I e pela Câmara Municipal de Cascais, no âmbito da programação do Bairro dos Museus. 

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