na cidade

5 à Vela. Esta família do Estoril está a dar a volta ao mundo pelo mar

Já viveram momentos assustadores com relâmpagos a cair a cada segundo e passaram 17 dias sem ver terra durante a travessia do Atlântico.
Estão a dar a volta ao mundo.

Ondas de cinco metros, trovoadas sem fim no Atlântico e tubarões que foram confundidos com mantas. Podia ser a premissa de uma série de televisão, mas tem sido a vida de uma típica família portuguesa nos últimos meses.

Quando João Magalhães lançou a ideia à mulher de fazer uma viagem à volta ao mundo num barco à vela, o primeiro pensamento de Laura Coutinho foi que o marido “estava doido”. Com três filhos de 10, 7 e 4 anos, a logística de deixar tudo para trás e partir numa aventura em alto mar era “uma loucura”, dizia a mulher, de 41 anos, João, contudo, não desistiu.

Depois de tirarem juntos um curso de vela, há mais de uma década, o consultor de 44 anos apaixonou-se pelo mundo da navegação. Seguiram-se outras formações na área, lançaram uma empresa marítimo-turística com passeios pelo rio Tejo e aproveitavam os tempos livres para viajar de barco em família, para Troia ou Algarve.

“Começámos a seguir nas redes sociais muitas pessoas relacionadas com o mundo da vela, incluindo famílias que andavam a navegar pelo mundo”, conta à NiC o casal do Estoril. Depois de um primeiro momento de hesitação, Laura começou a ponderar na “ideia louca” do marido. Este foi “estruturando toda a viagem” e que acabou por convencê-la a embarcar nesta jornada, que começou a ser pensada há quatro anos.

O primeiro passo foi trocar o barco que tinham por outro maior, mais confortável e capaz de navegar dias a fio pelos oceanos. Com 12 metros de comprimento e sete de largura, quatro quartos duplos, duas casas de banho e sala com kitchenette, deram-lhe o nome de Alvoco, em homenagem à terra do pai de Laura.

O início da viagem

Com tudo preparado, os 5 à Vela, como são conhecidos nas redes sociais, partiram em setembro do ano passado para a grande viagem da sua vida: uma volta ao mundo a bordo de um barco à vela. Nos próximos dois anos, a embarcação vai ser a casa do casal e dos seus três filhos, Vasco, Afonso e Teresa, todos eles fãs de água e de dar mergulhos no mar.

A família partiu de Portimão, onde estava atracado o barco à vela, e seguiu viagem para Porto Santo, o primeiro destino desta volta ao mundo. Nos últimos meses já fizeram paragens na Madeira, Canárias (La Palma, Tenerife e La Gomera), Cabo Verde (Ilha do Sal e de São Vicente), Caraíbas, Venezuela, Bonaire e Colômbia.

Atualmente estão parados no Panamá, à espera da autorização para passar o Panamá Canal para o lado do Oceano Pacífico, que será a travessia mais longa da viagem.

 

 
 
 
 
 
Ver esta publicação no Instagram
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Uma publicação partilhada por 5 à Vela 🇵🇹 (@sailing_alvoco)

 

 

A grande motivação para “uma aventura desta envergadura” foi mostrar aos filhos “o mundo nesta altura da sua vida” e dar-lhes a conhecer “outras culturas, outras realidades, outros problemas e sucessos”.

“A viagem não é fácil, de todo. Já tivemos que superar grandes desafios, nomeadamente travessias oceânicas, onde temos de aprender a reinventar-nos nu espaço restrito, durante 20 dias ou mais em constante movimento sem qualquer interrupção nem contacto com o mundo, onde temos de ser sustentáveis, autossuficientes e bastante resilientes”, admite o casal.

A travessia do Atlântico

Um dos maiores desafios (e conquistas) até ao momento foi a travessia do oceano Atlântico: 17 dias sem ver terra nem ninguém, em andamento 24 horas. Apesar de ter corrido tudo bem, a primeira noite da travessia, quando partiram de Cabo Verde, foi verdadeiramente assustadora. 

“Partimos depois do almoço e as previsões meteorológicas pareciam estar tranquilas. Ao final do dia, no pôr do sol, começámos a ver muitos relâmpagos. Ligámos a Internet e vimos que havia risco elevado de trovoada, que é o pior inimigo de um barco. Se temos o azar de ser atingidos por um raio, vai tudo à vida e ficamos no meio do oceano sem qualquer forma de contacto”, conta a dupla.

As horas seguintes, viveram com os corações apertados. Tentaram desviar-se das massas de chuva, mas houve uma altura que “já não havia volta a dar”. “Tínhamos relâmpagos a cair a cada segundo, à volta do barco todo, durante cerca de quatro horas. Foi algo intenso e assustador, e a sorte foi que os nossos filhos estavam a dormir e não se aperceberam de nada”, recordam.

Depois dessa primeira noite aterradora, seguiram-se “16 dias de uma experiência incrível”. Ao contrário do que acontece quando navegam pela costa, onde têm de estar constantemente atentos a outros barcos, a travessia no Atlântico é “um descanso total”.

“Pensávamos que ia ser pesado e que ia exigir muito de nós, principalmente porque estamos sempre a fazer turnos para alguém estar acordado, mas foi surpreendentemente tranquilo”, confessam. 

Durante a viagem, os miúdos aproveitam para estudar em ensino doméstico, uma tarefa que nem sempre é fácil, tendo em conta que o filho do meio, Afonso, enjoa com regularidade. “Têm um horário flexível, geralmente aproveitamos os dias em que estamos parados para fazer as atividades e os trabalhos. Nos dias em que o mar está mais agitado, é mais difícil”, revelam os pais. 

 

 
 
 
 
 
Ver esta publicação no Instagram
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Uma publicação partilhada por 5 à Vela 🇵🇹 (@sailing_alvoco)

 

 

Com três miúdos a bordo, por vezes também pode ser difícil entretê-las, mas João e Laura vieram preparados e são poucos os momentos mortos. “Temos as nossas rotinas, fazemos o pão para o pequeno-almoço, ajudam a pôr a mesa, trouxemos imensos jogos de tabuleiro, pescamos. Arranjamos formas de estarmos sempre entretidos, seja a ver um filme ou a ouvir música e a dançar”, revelam.

Nas travessias mais longas, têm tudo o que precisam no barco: os dois frigoríficos e o congelador estão cheios e há enlatados suficientes para se alimentarem durante a viagem. Por outro lado, também tentam pescar tudo o que conseguem, por vezes peixes tão grandes que dá para três ou quatro refeições.

Além da noite assustadora no primeiro dia da travessia do Atlântico, a família já apanhou outros momentos em que o mar estava agitado. O trajeto entre o Funchal e a Marina da Quinta do Lorde, na Madeira, foi um deles, onde apanharam ondas de quase cinco metros de altura. “Começou tudo a cair cá dentro. Os miúdos ficaram assustados, apesar de ter sido só umas duas horas”.

Já entre Bonair e Cartagena, tiveram de superar o “fenómeno meteorológico que traz ventos fortes e ondas que impunham respeito”. Depois de sete meses a bordo e cerca de seis mil milhas náuticas navegadas, os miúdos já se habituaram ao mar agitado. “Quando começa a abanar muito, já sabem que têm de tomar um comprimido para o enjoo”.

Nem sempre apanharam dias turbulentos. Um dos momentos mais positivos foi a travessia entre as Canárias e Cabo Verde, um dia em que ficaram completamente sem vento e não havia ondulação nenhuma. “Só se via azul à nossa volta. Saímos do barco, demos mergulhos e vimos tartarugas gigantes à nossa volta. Não havia brisa nem barulho, éramos nós sozinhos no meio do oceano, com um silêncio ensurdecedor, algo que é muito raro acontecer”, contam.

Mergulhar no mar e ver tudo o que se esconde baixo de água é outra das atividades de eleição dos 5 à Vela. A família recorda, por exemplo, o dia que passaram em San Blas, no Panamá, quando pensaram que estavam a avistar uma manta, um dos peixes que ainda não tinham tido oportunidade de ver ao vivo. Na altura, Laura estava dentro de água, mas não tinha os óculos, pelo que pediu ao filho, Afonso, que tinha os óculos na cabeça, para mergulhar e vê-la de perto.

“Assim que salta para a água e vê o que era volta para o barco. Disse que afina era um tubarão, fomos todos o Alvoco. Não era um tubarão agressivo, mas ainda não nos sentimos muito à vontade com eles”, confessam. Com golfinhos, a história é outra: têm sido os melhores companheiros desta aventura que ainda está longe de terminar.

Assim que conseguirem atravessar o Canal do Panamá, segue-se uma viagem de cerca de 30 dias pelo oceano Pacífico, antes de chegarem à Polinésia Francesa, o próximo destino. Até julho de 2026, os planos são fazer paragens nas ilhas Samoa, ilhas Salomão, norte de Austrália, Indonésia, atravessar o Índico para as Maurícias e Madagáscar. 

A ideia é ainda contornar a África do Sul, fazer travessia para Brasil e voltar às Caraíbas antes do regresso a Portugal. A viagem da família pode ser acompanhada nas redes sociais.

Carregue na galeria para ver algumas fotografias desta aventura pelo mundo.

MAIS HISTÓRIAS DE CASCAIS

AGENDA