As características singulares de Cascais, das paisagens à gastronomia, entre tantas outras, sempre foram fonte de inspiração para quem por ali passa. De reis e rainhas à procura de um destino de veraneio a pessoas comuns ali nascidas e criadas, de turistas que a visitam uma vez a estrangeiros que fazem da vila a sua casa, a beleza e os encantos de Cascais não passam despercebidos, seja num dia de visita ou numa vida inteira de morada.
Não é de estranhar, portanto, que se tenha tornado cenário privilegiado de estórias, inspirando famosos escritores portugueses, que lhe dedicaram palavras e descrições detalhadas no final do século XIX e início do século XX. “Ainda o advento ferroviário do final do século XIX não havia iniciado e já Almeida Garrett se escapulia furtivamente até Cascais, em busca do seu amor proibido, a Viscondessa da Luz”, conta o município.
Cascais tornou-se, assim, no cenário da história de amor proibida entre Almeida Garrett (1799-1854) e Rosa Infante, a Viscondessa da Luz, que durante vários anos trocaram correspondência e combinaram encontros escondidos em diversos pontos da vila. Em 1853, um ano antes da sua morte, Garrett publicou “Folhas Caídas”, livro de poesia, onde se encontra um poema intitulado “Cascais”.
Com a progressiva diminuição da distância entre Cascais e Lisboa, devido à melhoria de estradas e transportes, a vila passou a receber cada vez mais visitantes, aumentando o número de autores que escreveram sobre ela. Ramalho Ortigão, por exemplo, enalteceu as praias e as propriedades terapêuticas das suas águas.
Refere o município que, ao ler “Viagens na minha Terra” (1846), obra icónica de Almeida Garrett e da história da literatura nacional, o escritor portuense Ramalho Ortigão (1836-1915) sentiu o impulso de se aventurar nas crónicas de viagens. Escreveu sobre as suas passagens por Paris, Inglaterra, Países Baixos e Brasil, mas sempre revelou um gosto especial quando essas viagens se faziam por diferentes terras de Portugal.
Cascais ganha destaque na escrita de Ramalho Ortigão quando o assunto é a praia, seja no manual “As praias de Portugal: guia do banhista e do viajante” (1876), ou em “Banhos de caldas e águas minerais” (1875), livro sobre a existência de termas e águas terapêuticas em terras lusas. “Juntamente com o amigo e figura incontornável da literatura portuguesa, Eça de Queiroz, assinou ‘As Farpas’ (1871-82), um conjunto de folhetos de periodicidade mensal, que faziam um retrato da sociedade portuguesa, muitas vezes satírico, em todas as suas vertentes. Numa delas demonstra enorme satisfação pelas transformações urbanísticas anunciadas para a zona do Estoril”, refere o município.
Já Eça de Queiroz tinha Cascais como destino obrigatório na época balnear, com especial gosto de passear pela costa. Também ali reunia os principais intelectuais da época, os chamados “Vencidos da Vida” (do qual faziam parte figuras como Ramalho Ortigão, Guerra Junqueiro ou o Conde de Sabugosa), em jantares na Casa de S. Bernardo, onde se instalava a convite do amigo Conde de Arnoso.
Alberto Pimentel deliciou-se com a gastronomia local. Para Fernando Pessoa e Maria Amália Vaz de Carvalho, Cascais era um refúgio espiritual reconfortante. E, apesar do ambiente descontraído da vila, esta não escapou às principais questões do seu tempo, como apontou Ruben A., após ter convivido com refugiados da Segunda Guerra Mundial no Chalet Leitão, junto à Baía.
O município destaca também o papel de Branquinho da Fonseca, responsável por aproximar as bibliotecas da comunidade, através do seu trabalho enquanto conservador do Museu-Biblioteca Condes de Castro Guimarães, no centro da vila.
Foi a partir destas referências que ligam os livros à vila, que a autarquia decidiu criar a Rota Literária de Cascais, com o objetivo de se tornar um meio de promoção do património literário local. O percurso foi desenhado por António Ribeiro, aluno de mestrado da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e da Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril, no âmbito de um estágio que a Câmara Municipal de Cascais lhe facultou.

A Rota Literária de Cascais é composta por um percurso de três quilómetros que se completa numa hora. Pode saber mais informações no site da Câmara Municipal de Cascais e aventurar-se, seguindo este guia, a descobrir os locais cascalenses eternizados nas obras de diferentes escritores portugueses.
Experiência gastronómica e cultural
Anualmente, é também criada uma experiência gastronómica inspirada nesta rota, que pretende levar os participantes numa “viagem de saberes e sabores, influenciada por escritores portugueses que encontraram na nossa vila o seu refúgio criativo”, refere a autarquia.
A quarta edição da Experiência Gastronómica e Cultural ligada à Rota Literária de Cascais está marcada para dia 3 de maio. O evento tem início às 19 horas, onde poderá descobrir este percurso na companhia de um voluntário da Cascais Jovem (Programa Locals), que irá guiar os participantes, apontado os locais preferidos dos escritores e contando várias curiosidades sobre os mesmos.
Segue-se, depois, o jantar literário, pelas 20 horas, servido na Casa de Santa Maria. A ementa foi totalmente inspirada nos escritores e nas suas obras. Em 2024, assinalando os 50 anos da morte de Branquinho da Fonseca, este será o autor em destaque, cuja vida e obra será comentada pela professora Maria Mota Almeida, da Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril.
“Este momento será uma articulação entre diferentes áreas do conhecimento como a literatura, o turismo e a gastronomia, proporcionando aos convidados a vivência do património, da identidade cultural e da autenticidade da comunidade de Cascais”, refere a organização, dinamizada pelo Cascais Food Lab, com o apoio da Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril.
À semelhança da primeira edição, os pratos servidos irão interpretar os escritores e as suas obras literárias, de forma a criar diferentes perceções das mesmas. Em eventos anteriores, por exemplo, foi servida uma entrada “Kvass de morango, vieiras, ameixas caramelizadas em miso, pêssegos frescos e nastúrcios”, reportando para a “agreste natureza de morangos selvagens, capuchinhos e abrunhos de Sintra”, inspirada no livro “Viagens na minha terra”, de Almeida Garret.
Num ambiente exclusivo, onde os pormenores remetem para um universo literário de outros tempos, tendo sempre Cascais como referência, esta experiência promete colocar em destaque todos os sentidos. O valor é de 110€ por pessoa. Para se inscrever no evento, deverá enviar um email para info@nullcascaisfoodlab.pt.